terça-feira, 8 de novembro de 2011

Florbela Espanca


Ontem, por acaso descobri que gosto muito mais de Florbela Espanca do que imaginava.

Isso foi, em parte, o que me motivou a terminar o texto do post anterior, que comecei em 23 de fevereiro. Florbela Espanca é autora de Fanatismo, que não me agrada e mesmo assim sei de cor, e de Fumo, que é uma das minhas músicas favoritas de Fagner e obviamente também sei de cor.

Todos os poemas do seu primeiro livro, Livro de Mágoas, podem ser lidos aqui. Mas nunca mais de um por vez, para que um não ofusque outro.

Li todos e recomendo Desejos Vãos e De Joelhos. Porém o soneto que melhor se alinha com o que eu sentia enquanto escrevia o texto de hoje cedo é Castelã, que transcrevo na íntegra abaixo.
Altiva e couraçada de desdém,
Vivo sozinha em meu castelo: a Dor...
Debruço-me às ameias ao sol-pôr
E ponho-me a cismar não sei em quem! 
Castelã da Tristeza, vês alguém?!...
— E o meu olhar é interrogador...
E rio e choro! É sempre o mesmo horror
E nunca, nunca vi passar ninguém! 
— Castelã da tristeza por que choras,
Lendo toda de branco um livro d’horas
A sombra rendilhada dos vitrais?... 
Castelã da Tristeza, é bem verdade,
Que a tragédia infinita é a Saudade!
Que a tragédia infinita é Nunca Mais!!

Três homens em conflito

Um dos melhores filmes que vi em 2010 chama-se "Três homens em conflito". É um faroeste com uma trama interessante e a quantidade ideal de humor. Lembrei que, quando eu era criança, muitas vezes vi meu pai sair de uma locadora com uma porção de faroestes para ver no final de semana. Ele gostava mesmo. Apesar de não me interessar muito por cinema naquela época e não entender bem o que se passava ali, tive o prazer de assistir alguns desses na companhia do meu saudoso pai. Voltando a 2010, logo que subiram os créditos do filme fiquei me perguntando se meu pai já o tinha visto. Tenho certeza que seria do seu agrado e que muito o alegraria vê-lo ao meu lado.

A questão por tanto tempo martelou que acabei sonhando com isso. Lá estava eu sentado nos degraus da casa onde cresci, olhando para a rua onde com os amigos brinquei. No sonho, tive uma daquelas certezas inexplicáveis que só se tem em sonhos: Meu pai estava vivo! Eu não queria saber se ele estava bem, se sentia saudades de mim ou de coisa alguma. A única questão que me interessava, era: Será que ele já viu o filme? Levantei decidido a descobrir. Fui pelo corredor lateral até uma porta grande de metal que leva até a sala principal da casa. Entrei. Não o encontrei. Fiquei profundamente decepcionado. Tinha certeza que ele estava vivo! Em que outro lugar estaria? Ele vivia dizendo que era ali onde eu poderia encontrá-lo, mas... Passou. Depois desse sonho desejei um pouco menos a resposta para a minha pergunta. Pensei numa estratégia mais centrada no mundo real. Conheço o dono da locadora que citei antes. Se um dia encontrar com ele, pergunto se por acaso ele não tinha o tal filme. Se a resposta for positiva, é quase certo que meu pai o tenha visto. Mas, como dito antes, a questão já não mais me interessava, então não faria mais esforço algum pra descobrir a resposta.

Acontece que noite passada sonhei com meu pai. Ele estava na casa de um dos seus grandes amigos. Enquanto o dono da casa se ocupava com uma atividade qualquer, eu conversava com meu velho. Quando olhei pro seu rosto, senti surgir em mim uma perspicácia da qual não sou dono no mundo real. Instantaneamente me veio um plano que não me deixou pensar em outra coisa que não fosse colocá-lo em prática. Até então eu não sabia quem é o diretor de "Três homens em conflito". Se o mundo onde o diálogo acontecia era produto da minha mente, meu pai, o personagem desse mundo irreal, não poderia de forma alguma saber de algo que vai além dos meus conhecimentos. Fiz uma armadilha em forma de pergunta. Não citando o nome do diretor, restava ao meu pai fazê-lo. Se ele conseguisse executar tal feito, estaria cruzando a fronteira do meu saber, provando assim que o mundo onírico não é construído apenas pela mente de quem o sonha. Então perguntei:

-Painho, já viu "Três homens em conflito"?
-Já.
-E o que acha dos filmes do diretor?
-Clint Eastwood já fez filmes melhores. Veja por exemplo... - Aqui ele diz o nome de um filme que eu não me preocupei em lembrar. Não queria correr o risco de esquecer o "Clint Eastwood" que acabara de ouvir.

Acordei. Corri para descobrir imediatamente o nome do bendito diretor. Sergio Leone. Nunca ouvi falar dele. Ainda assim, Clint Eastwood é um dos atores principais do filme. Fico me perguntando se meu astucioso pai sabia do meu plano e escapou dele me fazendo crer que eu o havia feito funcionar. Mas então o sol vem e dissolve a brumosa esperança de encontrar meu pai vivo mais uma vez. Me resta chorar de saudade.