domingo, 31 de março de 2013

Cidadania


Hoje as notícias me incomodaram. Na hora do almoço um caixa foi explodido, na hora do jantar os hospitais estavam lotados. A senhora disse que veio do interior e a filha não pode ser atendida. Fiquei me perguntando de quem é a culpa. Paulo Maluf desviou mais que um bilhão de reais ao longo da sua vida política. ACM passou a capitania hereditária da Bahia ao neto. Sarney gostou da ideia e quer fazer o mesmo no Maranhão. Na Paraíba há os Cunha Lima. Em oposição a eles há José Maranhão, que nem falar direito consegue. A primeira dama do governador eleito está comendo lagosta e peixes ameaçados de extinção. Mas a culpa, de quem é? A culpa é da senhora que veio do interior.

Falar que vender o voto não é uma ideia inteligente é um negócio tão batido que só estou dizendo aqui porque quero ilustrar outra coisa. Existe um termo em economia chamado "Tragedy of the Commons", que não me atrevo a traduzir, mas que explico em seguida: Imagine que há uma determinada área de terra onde todo pastor tem direito de colocar os seus animais. O pasto que cresce nessa área é limitado, logo há também um limite para quantidade de animais que podem comer ali sem comprometer a fonte de alimento. Cruzado esse limite, o pasto começa a degradar-se até não mais existir. Analisando friamente, ganha mais o pastor que colocar a maior quantidade possível de seus animais no terreno, pois quem coloca um animal no pasto beneficia somente a si, mas divide o ônus com todos os outros pastores. Pensando assim, apenas no seu próprio benefício, cada pastor coloca os animais que pode, o que por fim resulta na destruição do pasto. Ou em hospitais lotados. Resumindo: Quem troca seu voto por um benefício próprio cria um problema para todo mundo, inclusive para si mesmo.

Tragedy of the commons é apenas uma das várias formas de demonstrar que ser egoísta nem sempre é o melhor pra você. Não posso dizer que pensar somente em si mesmo é algo estúpido, mas posso garantir que há um limite de até onde se pode chegar com essa estratégia.

O egoísmo tem o seu potencial destrutivo aumentado quando combinado com imediatismo e falta de empatia. Aos 26, ninguém pensa que em 50 anos pode estar sendo maltratado e mal atendido num hospital público lotado (falta de empatia). Pensa que até lá você já vai ter acumulado dinheiro o suficiente para pagar um plano de saúde privado. Essa forma de pensar é também a razão para a existência dos engarrafamentos. Cada pessoa que pega um ônibus lotado pensa logo em passar num concurso público e comprar um carro (imediatismo). Resolve o problema? Resolve. O próprio. Mas cria um novo pra cada um dos usuários do ônibus e para qualquer pessoa que trafegue nas mesmas vias que o novo condutor. E quando todos puderem comprar um carro? Aí então não vai mais adiantar ter um plano de saúde privado (para tratar o seu câncer de pulmão e suas úlceras desenvolvidas pelo estresse do trânsito) porque os hospitais particulares também estarão lotados.

Alguém dirá que a única arma que o povo tem para combater isso é o voto. Mas não há nada mais alienante do que pensar que voto é poder. Deixar de votar não é sequer uma opção, votar é obrigação legal. Cidadania é um pouco mais que isso. É fazer um pouco mais do que se espera, mais do que se é obrigado a fazer. É sobretudo doar um pouco do próprio tempo para assegurar-se de que os eleitos estão trabalhando dentro dos conformes.

O que quero dizer com isso é que não adianta cada um se preocupar apenas com seus problemas. Cada um de nós deve esquecer de si mesmo por um instante, para o nosso próprio bem, e pensar um pouco no bem comum. Afinal de contas, a rua insegura, a impunidade dos criminosos, os analfabetos funcionais são culpa nossa. E ninguém vai resolver sozinho ou com voto, mas com cidadania.