domingo, 9 de janeiro de 2011

Fuck me

Em outubro de 2010 Yann Tiersen lançou o seu sexto álbum de estúdio. Eu estava escutando a primeira vez e já tocava a penúltima faixa quando percebi que nada ainda havia me causado êxtase. Algumas coisas chamaram atenção, mas nada de deixar o queixo caído. Eis que começa a tocar a última música, uma com um nome bastante curioso: "Fuck me".

Acho que você tem o direito de ouví-la antes de ler o que tenho a dizer sobre ela.


Os primeiros versos dão uma pequena ideia do panorama onde se encontram os personagens da letra ao mesmo tempo que fazem uma provocação.

I know you know we’re falling into deep oblivion
I know you know we’re falling into a never-ending mess

A ideia de aproveitar ao máximo o agora pode parecer algo muito imediatista, mas parando pra analisar, você pode muito bem morrer antes de chegar ao fim desse texto. Aproveitando pra citar Mark Twain: "Fame is a vapor; popularity an accident; the only earthly certainty is oblivion." Fatalmente você vai ser esquecido. Não importa se isso vai levar uma semana ou se somente acontecerá quando a vida na terra foi extinta. O fato é que você vai ser esquecido. Então por que levar a vida tão a sério?

So we have to take care, take care
And share it, share it, share it together
So we have to take care, take care
And share it, share it, share it together

Então é preciso tomar cuidado e aproveitar a vida que temos. Aproveitar, aproveitar, aproveitar. E por que não juntos? Já imaginou estar num quarto sozinho com quem você ama e por quem é amado? Qual a primeira ideia que vem à mente?

Please, let’s get undressed, we need
To feel it!
Please, let’s get undressed, we need
To live it!

Agora! Tem que ser agora! (E aí vem o auge da letra. Você pode chamar de refrão, mas eu prefiro chamar de clímax)

Fuck me, fuck me, fuck me, fuck me!
You make me come again, you make me come again!
Fuck me, fuck me, fuck me, fuck me!
You make me come again, you make me come again!

Esse é um refrão que eu não me atrevo a traduzir. Especialmente pela inevitável perda da musicalidade.

E então começamos tudo de novo. Lá vem o imediatismo, o esquecimento, a imprevisibilidade do futuro. Roupas no chão.

(...)
Please, let’s get undressed, we need
To feel it!
Please, let’s get undressed, we need
To live it!

E aquilo que eu falei antes que era o auge passa a ser somente a sombra do que vem a seguir:

Love me, love me, love me, love me!
You make me love again, you make me love again!
Love me, love me, love me, love me!
you make me love again, you make me love again!

Agora, se alguém for capaz, me explique como diabos alguém consegue dizer "Fuck me" com tanta doçura? Eu me atrevo a responder. Não se pode dizer "Fuck me" tão docemente. Ninguém nunca disse. "Love me" é o que sempre foi dito. Você que entendeu outra coisa.

O que eu acho divino nessa música é a forma como uma estrofe inteira é substituída, sílaba por sílaba, mantendo a sonoridade enquanto altera por completo a mensagem. (Daí a minha recusa em traduzir.) Claro que no final das contas são somente duas palavras, mas isso não tira nem um pouco do brilho. E deve ter dado trabalho conceber um refrão tão maleável.

Se ficou curioso, a voz que se ouve nessa canção, além da de Yann Tiersen, é de Gaëlle Kerrien. E não adianta procurar na internet. Não encontrei nenhum outro registro da voz dela. Uma pena. Mesmo assim Fuck me é certamente uma das músicas mais bonitas que ouvi em 2010.

PS: Uma coisa que talvez nem todos os leitores saibam, e que é fundamental pra apreciar tudo o que a letra tem a oferecer, é que "make me come again" significa "me faz gozar novamente".

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